MANIFESTO ELEITORAL 2020--


https://www.youtube.com/watch?v=xWYR5Y-CtW0 --



MANIFESTO ELEITORAL 2020 final.pdf --



Caros Associados… Caros amigos



Hoje é dia 19 de Abril.


Faz hoje três anos que fui eleito presidente da Confederação dos Agricultores de Portugal, a nossa Confederação. Constituiu para mim um grande desafio, mas principalmente uma enorme honra. Não deixou também de ser de algum modo uma surpresa, uma vez que nos anos anteriores tinha-me afastado um pouco das lides de dirigente associativo, que foi, de facto, aquilo a que mais me dediquei desde que em 1983 assumi a Direcção da Associação de Regantes do Vale do Sorraia.


Passaram três anos, estando concluído o mandato a que me propus, encabeçando a Direcção que, em conjunto com os restantes órgãos sociais, conduzimos os trabalhos desenvolvidos até hoje. Não foi feito apenas por nós. Todos vós, associados da CAP e, particularmente, com todos os colaboradores da casa, formámos uma equipa e o trabalho de cada um reflecte-se no desempenho do todo.


Antes de tecer algumas considerações sobre o que me proponho fazer face ao novo ciclo eleitoral que se aproxima, começo por vos manifestar o meu reconhecimento, mesmo um sentido agradecimento, pela confiança e espírito de equipa que em conjunto fomos consolidando durante o mandato que agora termina.  


A razão porque vos escrevo hoje prende-se ao momento que atravessamos. O normal seria estarmos a preparar a Assembleia Geral Eleitoral, agendada para dia 22, daqui a apenas 3 dias, que pelas razões conhecidas foi anulada, adiando as eleições para uma data que ainda não nos é possível definir, mas que pensamos possa acontecer na segunda quinzena de Junho. Até lá, os órgãos sociais mantem-se em funções e a representatividade da Confederação continua assegurada.  


Como é do vosso conhecimento, resolvi apresentar-me de novo a eleições, concorrendo a mais um mandato como Presidente. Está já concluída a lista para ser divulgada e só não o foi ainda pela mesma razão que motivou o adiamento das eleições.   Era minha intenção ter-vos apresentado um “manifesto eleitoral”, um guião, com linhas mestras sobre os assuntos que, no meu entender, deverão ser as prioridades nas acções que a CAP desenvolve, identificando as áreas mais problemáticas, os esforços a que nos propomos, enfim, linhas mestras para o próximo mandato.


Numa altura destas, em plena pandemia da COVID-19 que assola o mundo, com o País em estado de emergência vai para 5 semanas e sem sabermos ainda quando terminará, a única certeza que tenho é de que nada será como dantes. O mundo vai mudar, aliás, já mudou, não temos é a percepção correcta do como e do quanto, mas que mudou, não tenho a menor dúvida.


De um momento para o outro a vida parece ter ficado suspensa, mas não ficou. E é exactamente porque não está suspensa que as consequências da paragem e do desmoronar de parte significativa da economia, vão trazer mudanças à sociedade que não vislumbramos ainda.


De qualquer forma não podemos parar. Tal como o lema que lançámos… “A agricultura não pára”…, também a CAP não pára, as nossas vidas não vão parar, o mundo não vai parar. Importa por isso irmos perspetivando o que pensamos para esse futuro novo que agora começa.


Resolvi assim voltar ao guião, elencar e partilhar convosco alguns dos assuntos que seguramente irão ter evolução nos próximos tempos, como os deveremos abordar e enquadrar numa estratégia de mudança e de evolução.


E são muitos. São sempre muitos, o que dificulta a tarefa e condiciona os resultados. Mas as coisas são como são e não há que fugir delas. Utilizando uma linguagem ribatejana …o toiro já se voltou para nós, agora há que pegá-lo… e, tal como nas pegas, é o trabalho do conjunto que leva a melhor.




Bruxelas, União Europeia e PAC


Se o tempo não tivesse ditado a situação em que nos encontramos, estou em crer que no verão teríamos novidades sobre o orçamento da União. Seguirse-ia, provavelmente durante a presidência portuguesa, no primeiro semestre de 2021, a aprovação da “nova” PAC e a sua nova arquitetura. Penso que os calendários possam eventualmente manter-se, tenho dúvidas é de como serão as conclusões de um e de outro. Com as negociações do orçamento suspensas, o que virá a seguir poderá trazer-nos uma realidade completamente diferente, com prioridades e regras que neste momento desconhecemos em absoluto.   No que respeita à PAC a dúvida é semelhante. Sem orçamento da União e com um mundo modificado, não vislumbro o que poderão ser as linhas mestras da, (agora sim) nova PAC para 2021-2027.  


Assuntos como a nova estrutura do Greening, os denominados Eco- Regimes, a luta pela manutenção do mecanismo da convergência, os pagamentos directos e os pagamentos ligados à produção, bem como a construção e divisão orçamental entre o primeiro e o segundo pilares, tudo está, de novo, por definir.  


Vai ser necessário a CAP – todos nós – prepararmo-nos bem e com ideias bem ponderadas para, cá e em Bruxelas, tentarmos minimizar os mais que prováveis impactos das alterações que vierem a ser propostas. Todos os avanços que nos últimos meses têm sido veiculados e avançados, até por verdadeiros especialistas nestas matérias, estão assim como que suspensos no ar da incerteza. Importa continuarmos a discuti-los entre nós, a analisarmos os seus efeitos à luz do que hoje conhecemos, mas cientes que tudo poderá ser posto em causa, em função da tal nova realidade, que apenas com o passar de mais algum tempo poderemos perceber. Qual o caminho que a Europa pretende percorrer e qual o papel da PAC na construção desse novo tempo! São duas questões que se interligam.  


A nível europeu há ainda dois outros assuntos, muito actuais, que seguramente se manterão na ordem do dia, mas que serão também reequacionados. (i) O roteiro para a descarbonização da economia e (ii) o Green Deal, da Sra. Ursula von der Leyen, actual presidente da Comissão.  


Neste momento que atravessamos, os assuntos relacionados com o ambiente parece estarem adormecidos. É seguramente falso. Adormecidas estarão as polémicas e as posições mais ou menos pró, mas seguramente que assim que a actividade política recomeçar a adquirir alguma normalidade, voltarão, quiçá com força e argumentos acrescidos, na sequência da aparente melhoria do planeta, evidenciada nas imagens e informações que nos chegam, fruto do forte abrandamento industrial e dos transportes a nível global. São por isso assuntos para os quais nos devemos também preparar consistentemente.



Mercados, Globalização e Brexit


Outra grande alteração que seguramente irá verificar-se no mundo será a forma como funcionarão os mercados. A intensificação da globalização das ultimas décadas fomentou uma concorrência sem paralelo na história da humanidade. Os produtos literalmente voavam de um lado para o outro, quase como se fosse a coisa mais natural do mundo. Em todo o lado se encontrava de tudo e do mesmo. Uniformizaram-se padrões de gosto, de consumo, de preferências. Do vinho às saladas, da carne às flores, dos animais vivos aos frutos secos, da fruta aos queijos, tudo tinha mercado, concorrência e oportunidades. Uma economia fervilhante, proporcionando negócio e prosperidade.  


Tudo isso, de um momento para o outro, está posto em causa. Começou a ser posto em causa ainda antes desta crise, através do Brexit, uma experiência que não deu sequer ainda os seus primeiros passos, travado que foi pela chegada da pandemia à Europa. Trata-se da primeira ruptura significativa com as regras instituídas. Uma ferida no projecto europeu, trazendo à realidade da vida a fragilidade de qualquer tipo de acordo. O mundo, de facto, está a mudar.


Mas esta nova realidade que agora vivemos posiciona a produção de alimentos em discussões a que se dava, desde há anos, pouca importância, como sejam o autoaprovisionamento, as reservas estratégicas, a autossuficiência ou os mecanismos de intervenção. Tudo vai voltar a ser colocado nas mesas das negociações, na construção de novas políticas e definição de prioridades. São também assuntos para os quais nos devemos preparar e debater.



O consumidor, o ambiente e a agricultura


Neste complexo puzzle o consumidor vai ter a derradeira palavra. Como foram os hábitos das pessoas modificados por esta nova realidade? O que vão alterar nas suas rotinas? São questões que seguramente alimentarão a argúcia dos sociólogos, mas não tenhamos dúvidas, estas alterações terão de ser percepcionadas com alguma antecipação, como forma de se adequarem produções e estratégias comerciais que potenciem a economia do sector agro.


O mesmo penso quanto a argumentos, e até a comportamentos, face às questões ambientais. Temos de puxar pela nossa inteligência e adaptarmos as nossas mensagens para que não percamos os efeitos positivos que vimos sentindo ultimamente quanto à imagem dos agricultores e da agricultura nestes tempos que vimos atravessando.  


Precisamos de encontrar as palavras certas no momento certo, ser objectivos na mensagem, seguros na fundamentação, apoiados na técnica e no conhecimento, sem rodeios ou dúvidas na defesa das práticas e do uso que fazemos dos recursos que exploramos.


A dinâmica do lema …A agricultura não pára… não se esgota com o aliviar dos efeitos da pandemia. Pelo contrário, tem de criar raízes fortes para que um dia cheguemos aos desejados frutos - a confiança e a preferência do consumidor. É um investimento grande que temos que fazer, talvez mesmo a derradeira oportunidade de aproximação ao mundo urbano que agora percebe (espero eu) a verdadeira importância da agricultura.  



Água, Florestas, Pecuária, Olivais, Seca…  


São conhecidas as minhas opiniões sobre os temas em título. Estes e outros assuntos foram ao longo do mandato objecto de várias reflexões, intervenções e tomadas de posição. O último momento em que tentei enaltecer todas estas áreas foi no Conselho de Presidentes, no passado mês de Novembro, em Tomar, por ocasião do 44º aniversário da fundação da CAP.


Proponho-me assim manter na agenda todos estes assuntos, agora sustentado numa mensagem com contornos enquadrados no pensamento que acima desenvolvi, face às mudanças que vierem a concretizar-se, na sequência do “renascer” para a nova vida que teremos por diante.


Portugal é o que sabemos, um território diversificado, não muito vasto, situado numa região do planeta fortemente sujeita aos efeitos das alterações climáticas que se vêm consolidando desde há já uns bons anos.


A desertificação e a seca em muito têm condicionado algumas actividades, como a pecuária e a produção florestal, e trazido para o dia a dia das populações terríveis impactos, como foram, e continuam a ser, os fogos rurais, que em três anos apenas ceifaram mais vidas e destruíram mais património que desde o início do século. A desertificação do território, climática e humana, são também um magno problema com solução muito difícil e demorada, dificultando o equilíbrio sócio-económico de vastas áreas do território, com destaque para o montado.  


A produção florestal continua a enfrentar dois tipos de grandes problemas. A acrescer aos efeitos da seca e das alterações climáticas, que nos trouxeram novas doenças e fraqueza na sua resistência por parte das várias espécies, juntaram-se inimigos humanos, especialmente contra os eucaliptos, nitidamente associados a uma postura ideológica que muitos prejuízos tem provocado na economia do sector e ao país. E também política, impondo custos absurdos aos proprietários florestais, ao obrigá-los a assumirem aquilo que são obrigações do Estado e da Protecção Civil.


A seca é, por outro lado, um assunto que obrigará a intensificar a luta pela criação de uma estratégia para a água. Como é sabido, luto pela construção de uma reserva estratégica de água que potencie até ao limite que a técnica nos permita, o desenvolvimento de uma agricultura economicamente mais agressiva, sustentada no regadio. Acredito na potenciação de vastas áreas do país onde o regadio possa introduzir crescimento económico, atraindo preferencialmente jovens que, pela policultura e poliactividade, reinventem aquilo a que, nem sempre pelas melhores razões, chamamos de interior.  


A agricultura de sequeiro é algo intrínseco à nossa realidade, tem o seu lugar e uma importância de destaque na ocupação do território e necessita de um enquadramento e de uma integração na economia das explorações, apoiada também na evolução técnica e no conhecimento científico.  


A época que vivemos actualmente trouxe para a ordem do dia a questão da produção e do comércio de proximidade. Associando as novas tecnologias à montagem de uma rede de contactos, de distribuição e de venda, como já está a acontecer, surgirão seguramente novos modelos de negócio. Na construção desse futuro, pouco claro, mas no qual acredito, destaco a importância do associativismo e das Organizações de Produtores, onde a formação profissional e a assistência técnica desempenharão um papel de enorme relevância.  


Também a pecuária enfrenta enormes desafios. Tal como a floresta, os efeitos da seca e a nova vaga de “ismos”, como o “vegetarianismo”, o “veganismo” e o “animalismo”, colocaram os produtores de produtos de origem animal num injusto dilema. Sabemos que a pecuária é, não só fundamental como sustento económico de milhares de produtores, como uma actividade indispensável como ferramenta de gestão do território. O valor económico da pecuária é um dos pilares da economia do sector agro, razão porque também por esse motivo o sector necessita de se posicionar perante o País como indispensável, o que é muito mais fácil dizer do que fazer. Mas somos resilientes e, com os cuidados que referi quanto à inteligência na construção da mensagem, é hora de colocarmos este assunto na ordem do dia, evitando-se que se transforme numa batalha sem tréguas, como se estava a tornar até há escassas semanas atrás. Desempenha aqui um papel de relevo a aquisição de mais conhecimento. Especialmente para a abordagem da questão da poluição provocada pela libertação de gases com efeitos de estufa. Terá de ser a ciência a dar as mãos ao sector, assunto onde a envolvência das associações e das OPs volta a ter lugar de destaque. Dar as mãos às universidades é uma emergência.


Pesticidas, olivais intensivos, colheitas nocturnas, modos de produção, são apenas mais alguns exemplos dos múltiplos assuntos da actualidade. Como atrás referi os assuntos são muitos. Não seria capaz, nem seria sensato, querer neste já extenso documento, tudo referir e tudo perspectivar como linhas de acção. Longe disso, o meu propósito é evidenciar o que penso serem os tipos de dificuldades e a postura a defendermos nos tempos mais próximos.


A CAP goza de mérito e de reconhecimento. É não apenas um facto. É a prova da qualidade dos seus argumentos, da objectividade com que apresenta os assuntos e defende os seus representados. Considero haverem dois fortes pilares a sustentarem esta posição de destaque. Verdade e capacidade técnica.


Verdade e frontalidade na defesa das opiniões, fundamentadas em capacidade técnica de análise, como poucos organismos possuem e nenhuma outra organização de cúpula dispõe. É fruto de anos de uma consistente busca de bem servir, de isenção e do conhecimento adquirido pela proximidade com os próprios agricultores. Por isso é tão importante o contacto com as diferentes regiões e com as diversas organizações. É a base da expressão que muito aprecio… a CAP somos todos nós!


Mas… está tudo bem? Claro que não. Organizações perfeitas não existem. O esforço para melhorar está presente e a organização está ela própria a esforçar-se para potenciar a aquisição de mais conhecimento aos seus elementos, em especial ao corpo técnico, já com a mira apontada a um futuro mais distante, onde o rejuvenescimento começa a vislumbrar-se.  


São também estas, preocupações que estão identificadas, razão que me leva a sentir que o futuro da organização está em boas mãos, pese embora as mudanças que referi no início, causadas pelo efeito da pandemia na sociedade e na política, nos possam trazer um futuro com dificuldades acrescidas. Mas a vida é isso mesmo… incerteza, um desafio permanente, que se vai superando e vencendo.


Termino com uma curta nota sobre política.  Qual a posição da CAP no espectro político nacional? O da verdade, da isenção e da seriedade. Não temos cor nem partido, defendemos a livre iniciativa e a propriedade privada, alicerçados no espírito Cristão e nos valores da Família. Somos uma família!


Eduardo de Oliveira e Sousa